segunda-feira, agosto 02, 2010

O munda fazia como o som de vidro contra vidro, a manhã logo no início. Tinha, então, uma fraqueza de coisa pequena de não dormido, um silêncio escondido pelos cantos dos pássaros - tinha uma senhora velhando num banco, o sol chegando até ela compaixonado, que não ouvia o que ele, só, falava, porque seus ouvidos eram dos pássaros e deles apenas; ele dizia, então-- um suspiro, que se perdia entre pios e farfalhares. Logo, mais um.

E ali ele estava, o jardim imenseando verde a sua volta, flores nascendo em botão, árvores e céu (prédios seguindo), mas seus olhos brilhavam delirantes, o mundo inteiro resumido encaixotado num único semblante de significado - que dormia, longe do seu saber, num malencaixado sono sobre um sofá amigo, de onde saiam sonhos de-porreados sobre coisas absurdas, ursos florescentes, crianças descontroladas, armas & balas de algodão doce, enfim. A velha viu-o, ela já levemente cozida, suas rugas marcadas por sombras escuras, seu rosto continental e lindo, franzindo 'inda mais num sorriso, seu jeito fraco franco, Que foi, meu menino?

Ele olhou, dela os olhos azul esverdeando, pensou que talvez dela fosse mesmo o mundo, então não seria ele, mesmo, um menino dela? se ele podia ser de outra, tão malconhecida, umas poucas horas de madrugada juntos... velha engraçada, queria ouvir a risada dela, fraca e verdadeira e divertida; ele estava extrapolando. Levantou do chão, batendo a grama das calças, sentou no banco bem ao lado dela, o cheiro dela suavizado (pelo tempo, idade, sol vento): A senhora quer a versão longa ou a curta?

Sabe que eu não tenho muito tempo? - os olhos dela diminutos ante o sol, fecharam-se por inteiro olhando pra cima, vendo calor - Se a conversa se anda muito, meu namorado fica ciumento...

Ele riu, a risada dela guardada esperava a dele para sair, senhora do riso envergonhado.

Tudo pode ser resumido... - ele começou; a velha era namorada do sol, por dentro ela sabia que ele nascia para ela, só saindo ao céu pela chance de vê-la, e no dia em que ela morresse, ah, tinha ela pena da humanidade, porque no primeiro dia o sol viria sem a encontrar, até achar seu corpo desfalecido sendo entregue à terra; o dia choraria de enciumado, a chuva de luto seria uma semana, e por pelo menos um mês a escuridão seria o firmamento, porque o sol perderia a vontade de sair de casa.

No instante mesmo, acordava a menina, sentando no sofá, deixando cair lençóis e travesseiros no chão - na boca, com a sede, um gosto açucarado, mas não lembrava mais o que era; não sabia como não tinha acordado sobre o tapete, o sofá tão minúsculo; foi tomar água, a calcinha tortamente guardando a bunda, a camisa fedida; no meio do gole, lembrou que sonhava em comer nuvens cor-de-rosas, foi até a janela--

... n'eu estar... - ele concluia, vendo uma cortina ganhar vida e dela florescer seu significado, a cara recém-desperta procurando nuvens com um jeito de criança; ele murmurou "...apaixonado" e os olhos de ambos s'entrecruzaram num sorriso.

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