quarta-feira, junho 02, 2010

A cabeça dela no meu lado, o cabelo dela loiro-loiro dourava no sol, brilhava tanto quanto, não se podia olhar para ele (não se podia olhar para ele sem se apaixonar), eu virado para um lado, ela para o outro, nossas cabeças se encaixando nos vãos de nossos ombros, a grama verde nas costas coçava, o sol caia bem de frente bem nos olhos, nós cegávamos e ríamos; eu fechava meus olhos e podia ouvir o corpo dela, o coração batendo e ela respirando, os sons dos movimentos curtos e contidos logo ao meu lado; podia ouvir a solidão toda ao redor no canto dos pássaros, nas vozes distantes, no seco do vento, no cheiro de mato.

"Nós devíamos compartilhar alguma coisa" - Por quê? - "Porque é o que faz um bom momento que se lembra para sempre" - É? - "É" - silêncio.

E então ela me disse, numa voz pequena feito um sussurro, contando de como ela tinha se apaixonado por um amor que tinha tudo para ser eterno e com isso ela quis dizer pelo tamanho, que era uma imensidão sem limites, ou assim a parecia porque ela era jovem e tentava ser romântica, gostar de flores, todas essas coisas bonitas como deitar juntos na grama e compartilhar alguma coisa, uma filosofia ou um segredo, sentindo o outro entrando dentro de si e ela entrando dentro dele, fechei meus olhos uma vez outra, entrávamos tudos uns nos outros, até que na lembrança ele era descartado no esquecimento de um amor novo, e do corpo nascia uma pele branca muito clara, porque ela era uma única dobradura de papel que eu fiz com as mãos, e eu podia sentir o frio no toque dela e fragilidade pequena de quando batia o vento ou o temor de que o amor fervesse apaixonado consumindo-a em cinzas impossíveis de se segurar nos dedos, manchando-me e sujas, espalhando pela grama e sobre meu corpo caído, deixando-me só num momento tímido em que ela não existe, sequer desempenha mais papel, mas ao pouco a reimaginava com sua voz ressurgindo em seus contos apaixonados, chamando-me de volta para a umidade de seus lábios, desejando uma vez mais um beijo que fosse, mas em que ela aquietasse com seus segredos e seu passado, me amando como se me perder fosse nunca mais encontrar um outro, e ela ainda me dizia da praia em verão quente, a areia pelo corpo, a água quebrando para embalar seu sono, o ser acordada por um beijo, o cheiro da pele queimando tomando conta do quarto, impregnando suado no lençol que os encobria, sua voz falhando na hora em que ela o agarrava as costas sentindo seus corpos pressionados e enudecidos, minha atenção se foi para o céu, podia ouvir as asas dos anjos soprando ao meu lado enquanto cantavam os risos de minha desgraça, compartilhei apaixonadamente a redenção de meu romantismo, enquanto as palavras delas desbotavam de imagens ao me dizer que eles juntos conversavam gozados madrugada adentro, dos planos que eu achava tão fúteis, agarrei-me as nuvens com formas distantes, como se nelas se escondessem as palavras que eu procurava para ir embora, mas cabia apenas chuva que não queria cair, eu sendo a testemunha eterna de um coração partido, a voz ainda me vinha mais distante num último marchar de suspiros, trazendo na costas a perdição de amores que nunca foram, eu ri uma última vez e gargalhei até engasgar com a hilariedade do mundo. Sentei, olhei bem dentro dos olhos dela, amando-a tanto quanto amaria, beijei-a a boca, dizendo "Isso foi um grande erro", ofereci minha mão e com elas entrelaçadas fomos embora.